sábado, maio 22, 2010

Diário de Bordo - I Marcha Contra a Homofobia

Diário de Bordo

I Marcha Nacional contra a Homofobia
Brasília, 18 de Maio



Então, já acordei às 4h da manhã, mal humorado por não ter dormido bem, chego ao local indicado e já encontro pessoas dispostas na frente do ônibus, pouca gente conhecida, aproveito o tempo para poder conhecê-las, gays, lésbicas, travestis, bissexuais, drags, heterossexuais, pessoas de Macaé, de Niterói, de São Gonçalo, de Maricá, do grupo Arco Íris, do Triângulo Rosa, do GDN, de sindicatos ou de nenhum deles, homem com nome de mulher, mulher com nome de homem, negros, brancos, altos, baixos, voz fina, voz grossa, de salto ou sandália rasteira, ricos e pobres, com muita ou pouca bagagem, tanta diferença, tanta diversidade em prol de uma única bandeira de luta, a criminalização da homofobia pela aprovação do projeto de lei 122/06 em Brasília soba forma de marcha.
Você começa a se deparar com dezenas de universos diferentes e a conhecer um pouco de cada um deles, que, aos poucos, vão surgindo as mais diversas constelações. Um dos pontos mais importantes da viagem, pelo que percebi, eram as paradas para o lanche e banho, com a oportunidade de encontrar pessoas dos outros ônibus e do nosso também, para conversar, tomar um cafezinho, fumar um cigarro, aumentando assim o vínculo estabelecido, várias histórias são contadas, fotos são registradas para marcar o momento e poder matar a saudades depois da viagem, ou para colocar no próprio Orkut, como disseram várias pessoas.
A caravana além de tudo possui um caráter político, por apresentar discussões, rodas, falas, cada um apresentou (não tod@s) suas opiniões sobre a marcha e sobre o movimento LGBT, por outro lado também existe um caráter lúdico, com brincadeiras, festas dentro do próprio ônibus, fazendo com que cresça ainda mais este vínculo.
Um dia inteiro até chegar a Capital Federal, pronto, vamos nos organizar para dar início à marcha, nos juntamos com o resto do Brasil, lembrando que muitos dos materiais utilizados como cartazes, faixas e gritos de guerra foram confeccionados aos poucos durante a viagem, estava tudo muito colorido assim como nossa bandeira. Ninguém podia ficar sem deixar de fazer alguma coisa, ora entregava panfletos ou jornais, ora segurava placas ou cartazes, ora sustentava o grito de guerra, um deles: “Fora Homofobia, homofobia fora, fora homofobia já chegou a sua hora.”. Via-se em tod@s garra e força de vontade movida pelo desejo de viver num país laico, sem discriminação e sem preconceito.
Com a marcha, o movimento ganhou visibilidade, ganhou força, fazendo com que o Senado agilize as negociações para a aprovação do projeto de lei, uma luta ainda muito difícil, mas que vamos conseguir.
Ao fim da marcha reúne-se tod@s para poder organizar as coisas, depois fomos almoçar, alguns dispersam-se, mas vão se reencontrando pouco a pouco, até conseguirmos juntar quase todo mundo numa grande roda de samba, cada um mostrou seu talento, seja cantando, escutando, batendo na mesa, nos copos, na palma da mão, dançando ou animando a galera, os laços de amizade ia crescendo, e outros, surgindo, transformando nossas mentes, nunca convivi com tanta diversidade junta, como por exemplo, um curioso caso de travesti namorar uma lésbica, dentre outros, de longe soa estranho, mas a convivência me ajudou a quebrar esse paradigmas.
As pessoas começam a ficar tristes sabendo que já era hora de voltar, apenas mais um dia na companhia do pessoal, aproveitamos ao máximo cada momento que sobraria, fiz grandes amizades, algumas com certeza não terei o prazer de reencontrar, outras sim.
É dada a contagem regressiva, poucas horas nos restam, hora de anotar os contatos. Pára tudo, o microfone está para quem quiser falar, para um momento de reflexão e de avaliação, mas quem quiser também cantar uma música ou contar uma piada fique a vontade, cada pessoa falou um pouco, fiquei emocionado com Fernanda da secretaria de direitos humanos de Maricá, quando falou: “[...] sinceramente, não serei hipócrita em dizer que fiquei com um pouco de receio de vir a marcha contra a homofobia, sabendo que sou heterossexual e o ônibus estar repleto de homossexuais, poderia sofrer algum tipo de discriminação ou qualquer outra coisa, pensei, e me enganei também, há dez anos viajo pelo meu partido, e esta foi a viagem que mais gostei, que mais aprendi, que mais me senti a vontade, realmente conheci pessoas com o potencial de mudar o mundo, muito obrigado a todas e a todos vocês por me proporcionarem este bem.” Acabou de falar limpando as lágrimas do rosto, merece uma salva de palmas. Os esforços de cada um foram reconhecidos. Até o meu nas palavras de Patrícia e Miguel, me emocionei na hora, posso falar um minuto?.
Maria de Fátima, senhora de idade, ambulante e camelô, heterossexual, mãe de filho homossexual, foi uma das pessoas que fez a diferença, chamada de mãe por tod@s. É dada a hora da despedida, Mãezinha chorou feito criança, todo mundo acompanhou no mesmo coro, tchau, beijos, abraços e saudades.
O que ficou da marcha?
Vontade de querer mudar essa realidade, de lutar pelos nossos direitos e da sociedade em geral, aprendemos ainda mais a conviver com as diferenças, a respeitar quem está próximo independente de tudo, no nosso caso, na nossa condição de vida no que diz respeito à sexualidade.
Baiana, apelido que me deram durante a viagem
Segundo Chaves

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